Marcelo Teófilo | Central da Música

eu3Entrevista para o Central da Música por Ricardo Schott em 27/9/2002

O produtor e músico carioca Marcelo Teófilo montou a Ettore Rock, um misto de gravadora e produtora, há quase dois anos. Marcelo, que já está tendo frutos com o lançamento da banda Umanoi (e aguarda o lançamento para breve do Cactus Cream e de João Moraes & A Patuléia), tem idéias bem claras a respeito do mercado underground – do Rio e do Brasil – e do lançamento de bandas novas. A Ettore está colocando a palavra “empreendedorismo” no mapa do rock underground carioca e vai longe, se levarmos em conta as idéias do seu pessoal, dos alicerces já colocados e dos planos para o futuro.

 

Essa entrevista – concedida numa segunda-feira chuvosa do Rio – tem como objetivo mostrar, antes de tudo, o que é a Ettore e quais são os planos dela para o mercado, agora que ela já está estabelecida, vendendo shows, marcando festivais, se associando com outras pessoas interessadas em fazer o mercado rock n roll crescer. Além do Marcelo, compareceu também à entrevista o assessor de imprensa da gravadora, Gustavo Leão (que também é músico e deve lançar material próprio com sua banda Jack Valente). E o Marcelo ainda diz que é pra gente ficar ligado porque vem um ataque ainda mais mirabolante às hordas da música no Brasil por aí.

 

CENTRAL: Você tinha uma banda antes de entrar para a área de produção, não é?
MARCELO TEÓFILO: Isso.

 

CENTRAL: Qual era a banda?
MARCELO TEÓFILO: Na realidade tudo começou em função do Prima Causa, que era a banda, e a gente fez uma série de shows no ano de 99, quando as coisas começaram, e justamente por falta de estrutura no mercado e tudo o mais, no Rio de Janeiro, eu comecei a produzir todos os shows do Prima Causa. Em função disso, eu comecei a produzir alguns eventos que não envolviam mais o Prima Causa e esses eventos acabaram resultando na idéia original da Ettore Rock.

 

CENTRAL: Antes da Ettore você já atuava como produtor, então?
MARCELO TEÓFILO: Sim, mas produzindo única e exclusivamente o trabalho do Prima Causa, ou seja: todo o meu trabalho de produção inicialmente era voltado para o Prima Causa. Depois, ao longo do tempo, nós sempre chamávamos as pessoas que tinham bandas – amigos e tudo o mais – e convidávamos para que essas pessoas tocassem com a gente. E automaticamente isso resultou no formato inicial de uma produtora – que no caso foi a Camerata, que eu montei junto com o baterista do Prima Causa, o Leonardo Sampaio – e depois nós chegamos ao fim da Camerata e eu automaticamente iniciei as atividades da Ettore Rock.

 

CENTRAL: Que alternativa que você pretende dar com a Ettore Rock para este mercado musical do Rio, do Brasil, etc?
MARCELO TEÓFILO: Na realidade o objetivo inicial da Ettore Rock era colocar, digamos assim, “ordem na casa”. Nós achávamos que a coisa estava muito dispersa no Rio de Janeiro e aí surgiu a idéia de algo como uma minicooperativa. Essa minicooperativa, na realidade, ela fracassou inicialmente, existiam seis bandas que faziam parte dessa minicooperativa, e ela fracassou. E aí surgiu a idéia da Ettore Rock realizar um primeiro evento no Rio de Janeiro, que seria um link para um futuro festival, ou uma futura programação do rock na cidade, mas de uma forma mais profissional e menos amadora.

 

CENTRAL: E isso há quanto tempo, mais ou menos?
MARCELO TEÓFILO: A Ettore Rock surgiu em maio de 2001, exatamente através de um projeto que eu havia montado que foi intitulado Rio Soul Rock. Esse evento aconteceria toda quarta-feira no Ballroom com três artistas novos e um artista já conhecido, fechando a noite. A Rádio Cidade, mais tarde, acabou se envolvendo no projeto e ele foi batizado de A Vez do Brasil. Antes disso o nome Rio Soul Rock já tinha sido divulgado no O Globo, e quando a Rádio Cidade entrou no projeto patrocinando o evento, foi sugerida a alteração do nome para A Vez do Brasil, em função do programa já existente. E daí esse projeto fez com que a marca Ettore Rock decolasse no Rio de Janeiro.

 

CENTRAL: Foi interrompido agora há pouco esse projeto, não foi?
MARCELO TEÓFILO: Foi, terminou temporariamente no início do ano em virtude da falta de espaço. A Rádio Cidade está procurando fazer um circuito através das lonas culturais e existe a idéia de que esse projeto volte numa estrutura um pouco menor. Bem, isso é o que eu estou sabendo inicialmente. A idéia é que seja um projeto mais aconchegante, de repente num dia de semana melhor, porque estava rolando às quartas-feiras e a idéia era que o evento acontecesse de repente nos finais de semana.

 

CENTRAL: Fala um pouco sobre as bandas que a Ettore vem trabalhando ultimamente.
MARCELO TEÓFILO: Bem, a Ettore Rock surgiu, como eu coloquei, fazendo esse evento que mais tarde passou a se chamar A Vez do Brasil, e quando foi em setembro do ano passado, conversando com a Claudinha e com o Robson da Rock Press, surgiu a idéia de uma coletânea de bandas cariocas, que seria o primeiro lançamento da Ettore Rock. Para essa coletânea, na realidade, seria feita uma promoção, para os leitores da Rock Press, em parceria com a Ettore Rock. Essa coletânea vai ser lançada no mês que vem, com um ano de atraso, mas em virtude de uma série de coisas. São 19 bandas do Rio de Janeiro e uma banda convidada do Espírito Santo, João Moraes & A Patuléia. Vai ter uma grande festa aqui no Rio, vai ser o start para um mini-festival. Quando surgiu a idéia dessa coletânea, comecei a ter contato com muitas bandas não só do Rio como de fora, e algumas bandas começaram a se tornar muito próximas da Ettore Rock, como o Umanoi (www.umanoi.com.br) que é o primeiro lançamento. Recentemente entrou para o cast da Ettore Rock a banda João Moraes & A Patuléia, do Espírito Santo, que tocou no festival O Dia D…

 

CENTRAL: A banda já vinha de uma forma independente, não?
MARCELO TEÓFILO: Isso, já vinha, mas o CD vai ser todo represensado e já vai sair, na segunda edição, com a logomarca da Ettore Rock. E hoje, no cast, além do Umanoi e da Patuléia, tem o trabalho do Cactus Cream, que já está em fase de pré-produção, o disco deles deve sair até o final do ano. Fora isso, o trabalho do Gustavo (Leão, assessor de imprensa da Ettore), do Jack Valente, que vai voltar todo ele reformulado, com outras idéias, outra concepção. E o meu trabalho, já solo.

 

CENTRAL: Apesar do nome Ettore Rock, vocês têm interesse em trabalhar com outros estilos? Por exemplo, coisas mais voltadas para a MPB, etc?
MARCELO TEÓFILO: A Camerata, o selo que eu havia montado com o Léo – este selo ainda existe, inclusive – tinha a idéia de fazer um trabalho mais voltado para a área da música instrumental, da MPB e também muita coisa relacionada a jazz. Ou seja: que a gente pudesse trabalhar em outras vertentes, ou seja, com blues, com soul, outras áreas da música.

 

CENTRAL: O próprio Umanoi já pega uma área bem black, eles não são uma banda só de rock. Tem black music com rock e tal…
MARCELO TEÓFILO: É, funk-rock, misturando soul e hip-hop, e com muito groove. Mas isso tudo requer tempo, muita paciência e sobretudo muito trabalho, e vamos aguardar. Porque dá tanto trabalho fazer isso tudo… ter um selo e uma produtora com um cast de cinco artistas já envolve muito trabalho. Mas nós temos um projeto muito maior em relação a Ettore Rock, de desenvolvimento não só no Rio como em outros estados, através de representações como se fossem “mini-franquias”. Nosso trabalho para os outros estados já começou, o projeto está em fase de desenvolvimento, o alicerce já foi bem trabalhado, mas é preciso um pouco mais de paciência para que isso se desenvolva de uma forma melhor. E nosso primeiro ataque, digamos assim… nosso primeiro objetivo, vai ser concentrar o trabalho no Rio de Janeiro e transformar o Rio numa grande base para toda a estrutura da Ettore Rock.

 

CENTRAL: Certinho… Gustavo, se você quiser falar alguma coisa…
GUSTAVO LEÃO: Não, queria só lembrar o Marcelo dos outros estados.
MARCELO TEÓFILO: Bem lembrado. Além do que eu já comentei do Umanoi, do Cactus Cream, da Patuléia, do Jack Valente e do meu trabalho solo, a gente vem apoiando bastante o trabalho do Brigitte Beréu. É uma banda de Natal que vem lutando bastante. O trabalho do Brigitte tem ligação com o festival Rádio Alternativa (www.radioalternativa.net), eles são “donos” do Rádio Alternativa, digamos assim, sócios da idéia do festival… Fora isso gostaria de deixar claro o apoio da Ettore Rock ao trabalho da Kátia Dotto, que é uma menina que fez uma opção por uma mudança radical em toda a filosofia, toda a concepção do trabalho dela, e eu acho que isso foi a melhor decisão que ela poderia ter tomado. Gostaria também de mencionar que a Ettore vem apoiando o trabalho do Som da Rua, que lançou recentemente o seu material e fizeram cem cópias, uma prévia do trabalho que vai ser lançado posteriormente, prensado na Sonopress e tudo o mais.

 

CENTRAL: Em termos de infra-estrutura, o que a Ettore Rock teria a oferecer? O que você já poderia adiantar aqui pra gente?
MARCELO TEÓFILO: Eu acho que o ponto forte do trabalho da Ettore está muito ligado à parte de marketing. Nós sempre pensamos numa coisa que se chama público. O que faz qualquer banda, qualquer selo, qualquer produtora, se chama público. Então a nossa preocupação básica se refere a público, estratégia de marketing. O forte da Ettore está ligado ao marketing. A Ettore se preocupa com a mídia, mas que tem plena consciência de que o trabalho de mídia é meramente institucional. O que faz o trabalho de um artista se chama público. Um artista com público tem gravadora. Um artista com mídia, não necessariamente tem.

 

CENTRAL: É verdade, tanto que se você pegar a história de bandas como os Raimundos… Eles entraram na Warner porque já tinham uma história por trás lá em Brasília. São coisas que chamam a atenção.
MARCELO TEÓFILO: É, eu acho que o diferencial de todo artista é o número de seguidores dele, e uma das preocupações – eu acho que até a maior preocupação – da Ettore Rock, está ligada justamente a essa parte do público, à carreira do artista e à formação do público desse artista. A Ettore Rock não é um selo e uma produtora que etá preocupada em vender CDs dos artistas, mesmo porque nós temos uma outra estratégia.

 

CENTRAL: O que você tem achado do cenário do rock underground? Você não acha que ele tem uma tendência a repetir os erros das gravadoras?
MARCELO TEÓFILO: Eu acho que no cenário alternativo, na realidade, 95% dos artistas alimentam os vícios da indústria fonográfica. Em vez deles partirem para uma postura totalmente revolucionária, eles alimentam todos os erros e vícios da indústria fonográfica. Já ficou provado por A + B que não adianta enfiar sua cara toda semana nos jornais, ser amigo de todos os jornalistas possíveis e imagináveis do Rio e do Brasil, que isso não faz você rolar. Eu volto a reiterar que o diferencial de um artista está numa coisa chamada público. Eu conheço, tenho amigos que se fizeram, hoje estão estourados em todo o Brasil e durante todo o percurso se preocuparam única e exclusivamente com uma coisa chamada formação de público. E acho que justamente por terem se preocupado com isso, essas pessoas chegaram onde estão.

 

CENTRAL: Mais algum plano para o futuro na Ettore?
MARCELO TEÓFILO: A partir do mês de outubro a Ettore vai colocar uma festa mensal, com o objetivo de levar entretenimento para as pessoas a um custo muito barato, a preços bem simbólicos. Ao mesmo tempo espalhar gradativamente esta festa pelo Rio de Janeiro e futuramente pelo Brasil inteiro. Ou seja: a gente está querendo dar o start num plano piloto que se refere a um circuito nacional, para os artistas alternativos – eu não gosto de falar independentes, mas como se fosse uma alternativa para o mercado. Eu acho que um dos trabalhos pioneiros da Ettore Rock foi transformar um estúdio de ensaio num palco para shows. É um espaço pequeno, mas as bandas estão acostumadas a tocar em lugares precários no Brasil inteiro, e existe uma taxa ociosa muito grande nos estúdios – ou seja, falta de artistas para ensaiar e tudo o mais, principalmente nos finais de semana, porque o maior movimento de estúdio é sempre de segunda a sexta. Então porque não transformar o estúdio num local de show para as bandas, com equipamento bom e tudo o mais? Então acho que a Ettore Rock deu o start nisso, nós fizemos…

 

CENTRAL: Uma coisa é certa, nunca ninguém vai reclamar do som!
MARCELO TEÓFILO: Nunca ninguém reclamou do som! E nem vai reclamar. Eu acho que isso possibilita às bandas tocarem com uma qualidade sonora muito melhor…
GUSTAVO LEÃO: Ar condicionado.
MARCELO TEÓFILO: Ar condicionado, técnico, com um estrutura muito melhor, com um ambiente que já é o da própria banda… Você não fica à mercê dos donos das casas de shows, porque voce tá lidando de músico pra músico. Então eu acho que foi um projeto pioneiro da Ettore transformar o Estúdio Forum num espaço para shows. Vamos estar fazendo a partir de outubro uma série de shows mensais no Forum, a idéia é que a gente leve este show para Niterói, Barra da Tijuca, Jacarepaguá, Zona Norte, Oeste, para todos os lugares do Rio e futuramente para fora do Rio de Janeiro. Eu acho que este é um dos trabalhos mais fortes em termos de consolidar um circuito nacional para as bandas alternativas. Posso te colocar que eu e o Gustavo estamos trabalhando bastante na idéia de um festival anual da Ettore Rock chamado Rio Soul Rock que, se tudo correr bem, pode ser que aconteça no primeiro semestre de 2003, e um segundo festival para o segundo semestre de 2003 que seria o Rocambole.

 

CENTRAL: Então é isso! Quer falar mais alguma coisa?
MARCELO TEÓFILO: Queria agradecer pelo espaço e dizer que um artista sem produção, sem um direcionamento, sem uma estratégia de marketing, ele não acontece. Então é importante encarar as coisas com profissionalismo, como em qualquer área, como em qualquer profissão.

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